Por entre as avenidas da cidade Preto e Branco, a luz do dia amanhecia e com ela amanhecia também os passos na rua.
Uns passos silenciosos, outros barulhentos, apressados, conturbados, atrapalhados, esbarrados, mas todos trocados...
Sabe-se lá de quem seriam, para onde iam, depois de quanto tempo parariam, se chegariam...
Acontece que, entre todos os passos, lá estava também o do curioso homem que havia sido o alvo dos julgamentos feito pelos juízes protegidos através dos vidros.
Os passos dele não eram como o dos outros, era apenas um passo picado aqui, e outro logo ali, não avançavam de forma rápida e contínua, apenas deslocavam-se para o lado e voltavam, como quem procura por algo no chão.
E era isso o que ele fazia: procurava... por botões!
Sim, botões perdidos na confusão do dia a dia, que eram esquecidos e, muitas vezes, nem percebidos, guardando todos em sua pequena caixinha.
Por que o fazia? Sabe-se lá... Ele não sabia.Mas sujeito ao acaso, um homem de aparência comum, de passos apressados na rua esbarrou em seu corpo, fazendo com que todos os botões recolhidos até o momento fossem ao chão.
Não parou para ajudar e muito menos se desculpar, continuou em sua pressa... Talvez fosse o único caminho que conhecesse.
Ao contrário, o homem zeloso dos botões abaixou-se para pegá-los novamente, enquanto pessoas aleatórias resmungavam:
‘’ Se trabalhasse não atrapalharia o caminho de quem passa... ‘’.
As palavras alheias assim eram resmungadas como se o caminho não fosse para que ele passasse com o corpo, como faziam todos, e sim para que passasse apenas, e muito de longe, com o olhar.
E, olhando ao redor, talvez procurando também a sensibilidade de cada ser que por ali passava, o homem dos botões captava as mínimas cenas que aconteciam ao piscar do sinal verde e vermelho do farol.
Ah, se seus olhos fossem uma dessas máquinas de tirar retratos...
Foi quando notou na calçada duas pequenas e sujas mãozinhas de um menino abandonado ajudando-o a recolher seus mimos. Bastou esse gesto e o homem deu-se conta de repente de qual era o sentido de recolher e guardar com tanto carinho cada um daqueles botões: não fazia deles uma coleção, pois sendo velhos ou novos, o destino deles era ter entre seus furinhos, veias de linha passando, costuradas em tecidos simples ou refinados, com abrigo em uma casa.
E as ruas? Fariam coleções de pessoas abandonadas?
E aquela criança? Teria veias de alegria passando em seu corpo? Um abrigo?
Não sabia, assim como também não sabia o que faria se soubesse.
Tirou o chapéu, agradeceu ao menino e continuou em busca de seus botões...Em sua cabeça, o homem teve a certeza de que a dimensão do fato não caberia jamais em sua pequena caixinha.
Preciso de mil minutos depois de ler qualquer coisa que vc escreve. Pra retornar do estado de sobrecarga intelectual.
ResponderExcluirs2
Amável, frágil e ainda assim gigante e profundo o suficiente para me afogar.
E o desenho, putz... tá lindo! queria vê-los pessoalmente... *--*
Incrível Carol. Tão doce quanto seu sorriso e tão profundo quanto as nossas confusões. E eu tb não sei se seríamos capazes de suportar o peso das tantas respostas que queríamos. Creio então, que o melhor caminho é confiar em um amor que nos leve a sentir o que buscamos e queremos, mas nos faça sentir aquilo que a circunstancia peça, ocasionando num futuro real e não sobrevivido e sim, vivido do nosso jeitinho intenso de ser ! :D eu te amo, amiga.
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